LUÍS FILIPE MALHEIRO
Europa nervosa...
Continuo a pensar, gostem ou não de ouvir, que num cenário eleitoral de abstenção significativa devemos questionar a legitimidade dos eleitos, já que a problemática da “representatividade” dos eleitos de certeza que nem se discute.
Quando em 2008 se assistiu à pouca vergonha de vermos uma União Europeia, ainda por cima em vésperas de eleições – e portanto em vésperas de nova pedincha de votos e/ou de distribuição de tachos (veja-se o que se passa com Barroso e nem as eleições se realizaram ainda!) – aldrabar o eleitorado europeu e, numa cumplicidade combinada nos gabinetes da nomenclatura comunitária, com todos os país (salvo a Irlanda devido à obrigação constitucional de realizar um referendo) empenhados numa estratégia de silêncio e numa descarada campanha de ocultação da divulgação, como era seu dever e obrigação, do Tratado de Lisboa, em todas as suas componentes, implicações e consequências a médio ou longo prazo, facilmente se constatou que esse comportamento hipócrita e nojento tinha que mudar em 2009, quando os que estavam então no poleiro precisassem dos votos do povo par a que não fossem derrotados.
O problema da Europa nos tempos que correm, reconhecidamente, tem a ver com a mediocridade generalizada ao nível da sua cúpula dirigente, bem como na quase totalidade dos estados-membros, na medida em que estamos perante uma Europa que se debate com a falta de líderes políticos, carismáticos e fortes, que cumpram as suas obrigações perante o povo, que não tenham medo de dar ao povo a possibilidade de se pronunciarem em liberdade. Tal como não é no fascismo idiota e absurdo, próprio de anormais como Le Pen, que a Europa e os europeus de revêem, de certeza que muito menos o conseguirão perante um manto de silêncio generalizado, de compadrio político intolerável, que caracteriza as actuais lideranças. Os europeus precisam de saber o que é o Tratado de Lisboa, porque insistem em considerá-lo importante, que mudanças tratará à União e aos europeus, que implicações dele resultam, etc. Os europeus não precisavam que os dirigentes europeus fugissem traiçoeiramente às suas responsabilidades, recusassem envolver-se numa campanha pública de divulgação e de debate, para optarem pela via mais fácil de imposição, por via parlamentar, de um documento que pelos vistos pode nem sair do papel. A crise colocou a União de rastos e ameaça reduzir a escombros o Tratado. E como se tudo isso não bastasse até temos o país que lidera a União – a República Checa – mergulhado numa crise política que derrubou o governo, que provavelmente vai implicar eleições nacionais antecipadas, porque não se conseguem entender quanto à posição que o país deve assumir relativamente ao “milagreiro” Tratado de Lisboa.
Recordo que no caso de Portugal, a votação na Assembleia da República, ás escondidas do povo, registou a maioria de votos favoráveis – PS, PSD e CDS/PP, cerca de 90% dos eleitos. A esquerda dos socialistas, PCP e os seus aliados “Verdes”, o Bloco de Esquerda e os deputados Luísa Mesquita (ex-PCP) e Pedro Quartin Graça (líder nacional do PT) votaram contra. A 9 de Maio de 2008, Dia da Europa, Cavaco Silva, satisfeito, como facilmente se adivinha, assinou a promulgação do Tratado de Lisboa, tornando-se então Portugal torna-se assim, o 9º estado-membro a ratificação o documento por via parlamentar.
Quanto a resultados eleitorais, Portugal não é excepção. As europeias são, regra geral, as eleições menos atractivas e, portanto, aquelas que registam maiores índices de abstenção:
1999
Inscritos 8.600.643
Votantes 3.465.301 (40,3%)
Abstenção 5.135.342 (59,7%)
PS 1.491.963 (43,1%), 12 deputados
PSD 1.360.593 (39,3%), 11 deputados
2004
Inscritos 8.748.600
Votantes 3.394.356 (38,8%)
Abstenção 5.394.356 (61,2%)
PS 1.511.214 (44,5%), 12 deputados
PSD 1.129.072 (33,3%), 9 deputados
Continuo a pensar, gostem ou não de ouvir, que num cenário eleitoral de abstenção significativa devemos questionar a legitimidade dos eleitos, já que a problemática da “representatividade” dos eleitos de certeza que nem se discute.
Incomodados com esta realidade, tanto o Parlamento Europeu como a Comissão, desdobram-se em iniciativas de propaganda destinadas a mobilizar os europeus, caindo nalguns casos num rol imenso de baboseiras, tratando-nos a todos como se fôssemos uns anormais. As patéticas “dez boas razões para votar” são disso exemplo, do que a idiotice é capaz. É que o problema de fundo, ressalvando o da ausência de líderes fortes, tem a ver com a incompetência da União Europeia em resolver a crise que afecta todos os europeus e que faz com que tenhamos mais de 20 milhões de desempregados no continente!
É neste contexto, onde começa a ser patente o nervosismo dos partidos – pressionados pela crise económica e social grave que desmotiva os europeus e que os afasta cada vez mais do projecto europeu, graças ao falhanço das políticas se à incompetência dos dirigentes europeus, que nos aproximamos de 7 de Junho, dia das europeias em Portugal, na certeza quase absolutas de que vamos repetir o cenário anterior, provavelmente agravá-lo, o de que teremos mais um acto eleitoral com as atenções quase superam a dobrar os votantes. Mas pelos vistos é assim que se constrói a tal Europa de que todos falam...
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